e dinheiro contado,
essa vidinha
de feijão requentado
chora amuada todo dia,
enquanto tenta alugar um cantinho
na lata de sardinha
da esperança.
Falta tudo
dentro e fora do corpo,
da alma, dos olhos cansados
com a mesma paisagem
doente e vazia.
Problemas se amontoam
nas gavetas: contas pagas
com o passado que insiste em ser
presente, promissórias
que vão expirar junto com o
último gole de cerveja em pé, no
bar mais sujo da cidade, e com tudo
mais que foi hipotecado quando
o último sonho caiu
da boca e se espatifou
na sarjeta das emoções.
O absurdo cospe na cara
do sentido e Sísifo vem
ajudar a carregar esse
rochedo descomunal
que cai sem parar.
A pequena tragédia cotidiana
se repete, a inutilidade de viver
e sobreviver mata, faz sangrar,
pesa demais:
O rochedo (nos) vence.
Quem pode ser superior
ao destino?
Qual é o convite da vida
para aqueles que perderam
a hora de acordar?
A voz da vida é tão baixa:
quase não posso ouví-la.
Somos todos heróis modernos.
Contemos nos relógio
os microssegundos
até o rochedo
cair novamente.
Karla Bardanza
O Mito de Sísifo
Os deuses condenaram Sísifo a empurrar sem descanso um rochedo até ao cume de uma montanha, de onde a pedra caía de novo, em conseqüência do seu peso. Tal castigo baseia-se na suposição de que não há castigo mais terrível do que o trabalho inútil e sem esperança.
Homero relata que Sísifo era o mais ajuizado e mais prudente dos mortais; há controvérsias, pois, outros autores relatam que Sisifo cultivava certa leviandade, tida por censurável, em seu tratamento com os deuses. Revelou os segredos deles. Egina, filha de Asopo, foi raptada por Júpiter. O pai espantou-se com esse desaparecimento e queixou-se dele a Sísifo. Este, que estava ao corrente do rapto, propôs a Asopo contar-lhe o que sabia, com a condição de ele dar água à cidadela de Corinto. Aos raios celestes, preferiu a bênção da água. Por tal foi castigado nos infernos. Homero conta-nos também que Sísifo havia acorrentado a Morte. Plutão não pôde suportar o espetáculo do seu império deserto e silencioso. Enviou os deuses da guerra, que soltou a Morte das mãos do seu vencedor.
Diz-se, ainda, que estando Sísifo quase a morrer, quis, imprudentemente, pôr à prova o amor de sua mulher. Ordenou-lhe que lançasse o seu corpo, sem sepultura, para o meio da praça pública. Sísifo encontrou-se nos infernos. E aí, irritado com uma obediência tão contrária ao amor humano, obteve de Plutão licença para voltar à terra e castigar a mulher. Mas, quando viu de novo o rosto deste mundo, sentiu-se inebriado pela água, pelo sol, as pedras quentes e o mar, recusando-se à voltar para o sombrio inferno. De nada adiantaram as ameaças, as invocações e a ira de Plutão; ele ainda viveu muitos anos diante da curva do golfo, do mar resplandecente e dos sorrisos da terra. Até que Mercúrio veio pegar no audacioso pela gola e, arrancando-o ao prazer da vida, conduziu-o à força para os infernos, onde o seu rochedo já estava pronto.
Observe-me com a leveza de uma bolha de sabão... e ache minha beleza... Ela está ao meu redor...no meu calor...no meu estado permanente de flor.
-Karla Bardanza-
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