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DEDICAÇÃO



Minha Senhora,
que assim seja.

Os oceanos contemplam
as tuas palavras,
as nuvens curvam-se perante
de ti,
a última rosa do verão
deita-se aos teus pés:
o céu e a terra estão aqui.

Minha Senhora,
os mistérios das águas
são mistérios sem fim
no livro dos dias.
Toda a poesia 
está tatuada nesta lua crescente
na minha testa.

Ontem
corri pela floresta,
pés descalços,
cabelos ao vento
ouvindo o lamento do meu lobo,
ouvindo as pétalas celebrarem
a suavidade das margaridas.
Minha Senhora,
percebo a fragilidade deste mundo
esquecido da vida
e
do sagrado.
Percebo o universo numa gota
de orvalho, neste instante
exilado dentro de mim.


O que está além deste jardim,
apenas tu e eu sabemos.
Acolha-me:
dentro do círculo estou.
Acolha-me:
pois sou tua,
pois sou e sou.

Minha Senhora,
a hora perfuma-se,
a delicadeza desabrocha,
o divino habita a minha alma.
Acendo uma vela
para iluminar o caminho
da estrela.
Minha Senhora,
regozijo-me,
posso sempre vê-la.

Que assim seja
por toda a eternidade.
O que procuro, não acho fora de mim
e nem o acharei sem mim também.
O que procuro Minha Senhora
é apenas o bem,
é apenas o bem.
Minha Senhora,
agora volto de onde vim.
Minha Senhora,
não há fim.
Há apenas começo.

Minha Senhora,
eu me ofereci,
e
agora os fios do destino
teço com reverência
e dedicação.

Minha Senhora,
eis aqui a tua imensidão.
Que assim seja,
que assim se faça.
)o(






Karla Bardanza














Copyright © 2011 Karla Bardanza Todos os direitos reservados

VOCÊ TEM UM LENCINHO DE PAPEL POR AI?

                        
Esses olhos azuis
vigiam o meu corpo
que escorre tão sem freios.

Esses olhos azuis
arrebentam os meus seios
e eu estou cansada demais
para pensar, sentir,
gostar.
(você tem um lencinho de papel por ai?)

Minha garganta inflamada,
minha sinusite, minha rinite
e todas as minhas alergias
atrapalham a poesia
que quer passar
enquanto eu espirro 
mais uma vez.

Sento para sentir,
e sinto apenas esses olhos
aqui e ali.
Nada tenho a declarar.
Fechei para balanço.
(Quando é que vou voltar a respirar?)

Quero apenas cuspir
e ser feliz.
Quero apenas fugir
desses pingos nos is.

Agradeço a gentileza,
as palavras,o bolo e tudo mais.
Mas, neste exato momento
só quero mesmo tossir
em paz.




Karla Bardanza



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EU SOU A MULHER QUE CARREGA O VENTO NAS MÃOS



Não estranho a voz do vento, nem aquela mulher
extraindo delicadeza de sua harpa cheia de calma.
Meus olhos querem esses mistérios das florestas,
essas árvores plantadas pelos duendes e fadas
nos silêncios antigos, no colo da noite sem fim.

Quando a hora suave dilue mansa, a lua acende
a sua luz apenas para mim: caminho pelas trilhas
encantadas suspensas entre o abismo e o nada
que é a minha substância poética nas noites sem 
paz, nos instantes que se evaporam com graça.

Acendo velas e incensos, dentro do círculo estou
e as minhas mãos buscam apenas a magia que
ainda existe nas dobras das estrelas, nas sombras.
Ouço o chamado dos mistérios e vestida de céu,
celebro o que sou porque sou porque serei e será.

Há tantas palavras em minha boca,há tanta luz neste
amor perfeito, nesta perfeita confiança. Minha alma
dança: os quatro cantos de mim estão guardados.
Os quatro cantos de mim são sagrados: eu sinto, eu
sei, eu sou o que aprendi olhando as mãos da lua.

Nua, caminho pelos reflexos, pelas alamedas que
vão da alma ao coração e quando o rito é lembrança
eu sou o meu único mito, eu sou a mulher que carrega
o vento nas mãos. E nestes momentos que o poder está
fora, a minha alma inteira cabe dentro do meu coração.

Karla Bardanza









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E ELA ABRIU A JANELA

               
 O lago ficou
quando ela voltou.
A casa com jardim
e os livros
também.


O gelo do inverno
e as árvores
choraram.
Ela estava quase bem.


Quando chegou,
a vida tinha pouco sentido.
A língua era outra,
o sol era forte.
Ela havia se perdido.
Ela tinha vindo do norte,
daquelas florestas imensas
e belas.
  Ela tinha deixado a vida
lá em cima.


Foi então que
abriu a janela
e chamou por ele
alto, sem
mais ter por onde sangrar.


E de olhos fechados,
começou a viajar.
Ela se sentia tão leve
e de seus olhos escorriam
pétalas de flores de todas
as cores, iguazinhas as que 
ele tinha posto nos cabelos dela
um dia, 
um dia.


Sem ele,
ela era apenas silêncio.
Lembrou das palavras,
dos sentimentos,
daquela dor, daquela dor
tão igual a essa dor.
Lembrou do lago.
Mergulhou.


Quando acordou,
sua mãe segurava a sua mão
e ele estava envolto numa luz,
naquela luz que não era dela.


Um dia, 
ela abriu a janela
novamente
ao invés de olhar para baixo,
olhou para o céu
e
ele sorriu
ele apenas sorriu.




Karla Bardanza








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PARA TODOS OS EFEITOS



 Para todos os efeitos,
esconderemos nossas vontades,
digitais e defeitos
e se alguém perguntar,
diremos sempre não.


Para todos os efeitos,
mentiremos até para nós mesmos,
figindo que isso é apenas isso
e
mais nada.
(Esses pactos me deixam apavorada)

Falaremos pouco,
evitaremos a rota do sol
o brilho excessivo 
dessas coisas às claras.

Isso que há entre a gente
é...como direi...
uma coisa ( coisa de novo!)
uma coisa rara.

Ficaremos imóveis
mesmo no calor,
ficaremos sangrando
mas suportaremos a dor.


Para todos os efeitos
é melhor que o crime
seja perfeito
e que os nossos olhos
só testemunhem o vazio
do depois.

Para todos os efeitos
nunca houve
esses (des)encontros
entre nós dois.




Karla Bardanza



















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TENHO PENA DESSE HOMEM



O que ele vê é a tosca ilusão
Do que está distante de sua
Mão direita, de sua imediata
Visão curta e contramão.

Aquilo é tão pouco, tão pobre
E pouco. Mas ele é quase cego,
É quase surdo, é quase mudo.
Tenho tanta pena dessas cenas
Que evaporam e causam curtos
Circuitos.
Tenho tanta pena dessas coisas
Vazias de intuitos.

O que ele vê lhe basta, castra
E amaldiçoa quando se percebe
Só e ignorado no ato sagrado
E obsceno que a emoção fraca
Causa nos cantos de seu desejo
E carência.
Tenho tanta pena dessa experiência
Que sem sentido dá sentido à alma
Sem flores desse homem pela metade.

O que ele vê é a sua limitada verdade
Sem amanhã, é o prazer que derrete
Quando o instante vai embora porque
Ele nunca realmente esteve ali.
Tenho pena desse homem que
Quer quase nada para si.

Karla Bardanza





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OS IMORTAIS


Esse sorriso sagrado
na minha cara
é porque eu fui passear
e quando chegamos lá,
meus alunos, minhas alunas,
meus amigos
sofreram uma grande transformação:
eram deuses e deusas
de uniformes ou com as câmeras
nas mãos.

Por algumas horas,
apenas por algumas horas
não éramos professores e alunos,
nada nos dividia,
e a beleza do momento
eram as Letras,
todas as Letras
da Academia Brasileira de Letras.

E diante de Machado de Assis,
senti tudo quando um aluno
começou a me perguntar
os nomes dos imortais
e eu com o meus olhos sem paz
depois de saciar a sede dele,
disse sorridente:
- Nossa!Quase esqueci de te dizer
que os outros imortais são...
os seus colegas, os seus professores,
eu e você.

Quando o riso explodiu,
criamos asas nos pés
e voamos para o céu,
pigando conhecimento
e palavras com gosto
de mel.





Karla Bardanza





Para os meus amigos queridos Nídia, Danuse e Marcos e 
meus/minhas alunos/alunas brilhantes.Vocês são realmente
IMORTAIS










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AI! ESTOU TÃO CONFUSA!





 Já nem sei mais a diferença
entre alone e lonely.
Ficou tudo a mesma coisa
depois da última porrada
ou será torrada?
Ai! Estou confusa!
Meu vocabulário anda tão carente
de emoções.



Tomei um porre sem beber.
É, eu sei, é um porre essa vida
sem aqueles poetas que você 
me enviou.
Fiz um download tão rápido.
Só não consegui foi baixar
esses muros que nos separam,
esse desacerto filho da mãe
que me escurece todo dia
antes tentar, antes de ser.




Estou doente:
devo ter somatizado
tudo que deu
errado.
Minha garganta dói.
Deve ser por causa dessas
coisas entaladas,
achatadas
dentro
de
mim.


Hoje, me aborreci só
para variar.
Fiquei ameaçadoramente
louca e impotente,
gritando com a garganta 
inflamada,
descobrindo que eu
sou assim um pouco parecida
com um zero à esquerda
ou será um grande nada?


Ai, estou tão confusa!
Providenciem um divã e se não
der certo, chame um psiquiatra.
Meu Id, Ego e Super-Ego
estão entregues às baratas.


Podem me amarrar na cama
ou quem sabe me pôr numa camisa de forças.
Essa droga ainda vai dar confusão.


Ai, estou tão confusa!
Por que será que eu sempre me deixo
na mão?








Karla Bardanza

Sheila Chandra cantando.Amo essa música.











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UMA FLOR NÃO É UMA FLOR


Faz de conta
que foi verdade
e
que uma flor não
é
uma flor.

Faz de conta
que a poesia está tonta
nas mãos de uma deusa
qualquer.

Faz de conta
que há perdão
na espada
e
na balança
 desta mulher.




Karla Bardanza





















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SILÊNCIOS, ATROCIDADES E DISTÂNCIAS


Há grandes silêncios em meus vãos.
Há essas coisas caladas dentro.
Algumas vezes, nem sei o que falar.
Meus olhos morrem em ti,
morrem amordaçados.

Frases e sílabas são poucas
para te falar do meu amor.
Eu te aceito com as tuas dúvidas
e pequenas vaidades,
eu te aceito preso nas ferragens do teu ego,
eu te aceito com essa meia dúzia
de frases entaladas na garganta:
aquelas que esquecestes de me dizer
quando eu fui mais cruel e amante.

?Pequeno grande homem distante,
quando a fonte se abrirá novamente.
A pele grita nas entrelinhas,
o gosto é sempre por conta da imaginação:
tuas mãos são tão belas
quando o poeta salta de dentro de ti.

?Que atrocidades me restarão
se eu te enterrei
mas fui eu que morri.





Karla Bardanza








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LETRAMENTO



O meu letramento
veio com o vento.
Com ele aprendi a voar
e a ler as pétalas das azaléias
sem muita pressa.

Aprendi também a interpretar
os carneirinhos nas nuvens e as estrelas
e também a entender um pouco mais
a Lua e os seus enigmas.

O vento levantava os meus cabelos
e me incentivava a ler as diversas
tipologias intertextuais
dos caules das árvores,
especialmente quando havia
um coração e dois nomes distintos neles.

Lentamente me apropriei da escrita
e comecei então a fazer poesia da vida
assim como quem não quer nada,
querendo quase tudo.

Minha leitura do mundo
sempre foi fundamentada
no imediatismo do sonho
e no surrealismo da alma.
Às vezes, as minhas palavras
não estão nem dicionarizadas.
Melhor dessa forma
que informa o nada
e abraça o vazio com voracidade.
-Verdade demais deforma-

Sempre recorro ao vento
quando fico indecisa diante
das metáforas e
das figuras de linguagem
em geral.
Sento no melhor jardim
e arranco os olhos para sentir.

Sentir é sempre melhor do que saber.






Karla Bardanza










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POEMA DESNECESSÁRIO


A lua nasce e morre em mim:
eu a bebo com os olhos azuis,
eu a escondo nos bolsos
e entre os seios
sempre que perco o fim
ou
os freios
na noite sem memória.

Vou pela cidade
e ela está numa poça d'água,
morando calma,
em sua
pura reflexão
e reflexo.
Com ela por perto,
não preciso de explicação,
tampouco de nexo.

De tão azul
é quase um clarão
na palma de minha mão.
De tão amante,
não a quero distante.
Ela é mais que uma jóia
pendurada no pescoço
do céu.
É uma fala improvidada
pelo poeta bêbado
à mesa do bar
quando o estoque de inspiração
acaba no meio do discurso
que já não pode mais ser
politicamente correto.

A Lua é a única coisa
de concreto neste momento
de poeira e fracasso
cheio de rastros.
É possivelmente um dos motivos
que ainda me leva a olhar
para fora e para dentro
simultaneamente
quando
sou gente
e me descongelo,
e me desengaveto,
quando o teto está caindo
em cima de minha cabeça
empoeirada e cheias de teias
de aranhas.

A lua ainda me assanha
e eu uivo em solidariedade
pelos anos que já morreram
na minha boca cheia de cosmos
e
saudade.

A lua nasce e morre em mim.
Mais um poema sobre ela
é absolutamente desnecessário.




Karla Bardanza











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LAVADEIRA, SIM SENHOR


Quando ela traz a roupa dele
para lavar no riacho,
esfrega com (im)paciência
as sujeiras que ele deixou escorrer
no branco das palavras,
batendo sem bater
nos brios daquele homem
em eterna contradição.

Seus dedos estão feridos
demais para limpar aquelas coisas
com o pouco do sabão que
guardou apenas para ele.
Suas unhas e sua ira
quebraram junto
com o tempo dos poemas
e
foram levadas pela espuma
e pela água.
Esse ofício de esfregar
na cara dele
as decepções
é
quase uma missão,
é quase uma mágoa.


Silenciosamente,
ela olha as manchas
e não sabe como
dar conta delas.
Ela tenta lutar
contra o que está ali,
esfregando até os dedos sangrarem.
Mas, aquilo continua e continua.
Ela abaixa a cabeça
por alguns minutos,
 sentindo a dor de dar
murro em ponta de faca
e mesmo fraca,
rasga a roupa,
rasga ele,
rasga tudo
toda louca.






Karla Bardanza














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ALGEMANDO AS PALAVRAS



Ficamos cara a cara,
você deitado no sofá
reclamando da vida
e
 eu te escutando.


Fiquei grávida;
pari flores logo pela manhã chuvosa
quando acordei.
Tudo estava encharcado:
o meu sonho,
a tua barba que desapareceu,
as vidraças sujas,
as heras assanhadas,
a minha cama encantada.


Deito nela
e
durmo com você.


Ai a chuva foi inundando tudo,
afogando as ilusões,
enchendo de água
a minha alma calada,
nublando o dia
com mais um nada.


Deixei que ela me levasse
numa correnteza
e me jogasse contra um rochedo
enorme.
Algo em nós dois acorda.
Algo em nós dois dorme.


Estranhos
são os caminhos percorridos
pelo coração
que se desdobra à noite
e vai procurar o amor escondido
no tempo,
trazendo todas as palavras
caladas, todos os sonhos
do vento.


Ficamos cara a cara
e a sós mais uma vez:
você deitado no sofá
e eu como sempre
vestida de ti,
algemando as palavras
de amor ao pé da cadeira
para que elas, dessa vez,
(apenas dessa vez)
não pudessem fugir.








Karla Bardanza















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