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LETARGIA


Quadro de Ans Markus




O mais difícil
é a ilusão,
é a mentira
que embala
e nos pega pela mão,
mesmo quando
não há nem promessas.

O mais cômodo
é a pressa
de se chegar rápido
a lugar nenhum,
sendo menos
que um,
sendo um nada
entre dois infinitos.

O mais difícil
é quando me fito
e sinto tão pouco
por mim mesma.


Karla Bardanza

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EU SOU GENTE QUE VOA

Quadro de Stephen Mackey





Quero poucas coisas de você:
um punhado de sol,
um pouco do que talvez
eu mereça,
uma réstia da luz
que já não sei onde está.

E enquanto fico aqui
quase cega,
uma coisa dói na garganta,
uma coisa foge de mim
e eu fico parada
sem saber o que fazer.

O que me resta mesmo
nesta história
é quase nada,
é quase nada dentro de você.

Toco minhas mãos, 
sinto a minha pele,
não me pareço
com um objeto.
Não me pareço
com o que os teus olhos
podem ver.

Eu sou gente
de carne, osso e asas,
eu sou gente que voa,
seu moço.
 

 



Karla Bardanza










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POEMA DE AMOR

Quadro de Kirsten Bailey






Te quero tanto
que dá medo.
E medo dá
quando te beijo
e as estrelas caem 
aos meus pés
ou mergulham
nos teus olhos azuis.

Tudo ao redor
corre, voa,
naufraga,
e não ha vaga
aqui dentro
para mais ninguém.

Te faço amor
sem fazer,
te engulo,
abraço,
e injeto na veia,
caindo nas tuas palavras mansas,
desejando mais,
dizendo não,
fingindo paz.

E sofro
todo dia,
querendo
o que você
também tem
medo de me dar.

Por que dói amar?

Deveria ser light,
white, fácil assim:
era só manter você
ocupado dentro de mim,
era só afrouxar os nós,
mas tua voz faz eu
me desconhecer.

Então
eusouvocê,
eusouapenasvocê.


Karla Bardanza

 




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POEMA MIUDINHO

Quadro de Imma Merino




Dorme
os sonhos perfeitos
com a cabeça cheia
de caracóis.

E nunca sequer
ousar falar
nós:
palavra composta,
intransferível,
águas passadas,
um pingo de nada
na imensidão
da
solidão.




Karla Bardanza








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AS TERNURAS DA DOR

Quadro de Graeme Balchin




Março é um mês cruel:
a vida veste as mesma cores
e eu fico roendo as unhas,
antecipando o final.

Corro de tudo,
mas o fim do mundo começa
toda segunda-feira às 7:10 em ponto
e o meu corpo tonto desobedece
as ternuras da dor.

O exílio é quase suave.
Em meus desertos,
apenas a verdade absoluta
da erosão,
apenas a luta inglória de quem perde
sempre calada
um pedaço do coração


Karla Bardanza
 




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DA PROCURA DO AMOR

Quadro de Dan Schultz





Por muito tempo
ela pensou em achar 
o amor por ai,
como se ele estivesse
nas encostas do paraíso
ou mesmo perto das coisas 
sem nome.

Apenas quando ela
parou de sentir fome que finalmente
entendeu:
o amor não se encontra
do lado de fora.

Aqueles que se procuram,
estão dentro um do outro
desde de antes do verbo
ser mais que o verbo
e da vida florescer
na pré
ou pós-eternidade.

Aqueles que se procuram
estão mortos de saudade
do que já foi
sem ter nunca sido
porque já foi
sentido,
porque já fez
sentido.



Karla Bardanza








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DENTRO DAS BRUMAS

Quadro de Mary Alayne Thomas



Ainda procuro
por respostas por ai.
Bato em portas
com os punhos fechados,
descabelo o tempo
com a minha insanidade.

E quanto mais
corro de mim,
mais estou dentro
da brumas,
sendo menos eu
e mais uma.



Karla Bardanza







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ZERO

Quadro de Hamish Blakely





Se eu pudesse sentir
esse abandono de dentro
para fora e não de fora
para dentro,
eu acharia o eixo,
o centro que já me faz falta
dia sim e dia não
quando tateio o seio
e quase nada encontro
além de uma pequena variação
de mim mesma.

Sinto quase nada:
apenas coisas que fazem
a minha pele quebrar.
Desencontrei-me
de mim mesma.
Nem duas mais sou.
Sou apenas um indivisível zero
cada vez que tudo espero
e saio com mãos mais vazias
do que cheguei.




Karla Bardanza









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A CLARIDADE DA ESCURIDÃO

Quadro de Margarita Georgiadis





Estive escutando
o meu próprio silêncio,
lendo Krishna Das,
pensando nos Deuses
e em coisas infinitas.

Meus olhos mortos
enxergavam o meu ego,
minha alma cansada
apenas dormia
e a poesia,
calada,
fugia
de minhas mãos.

Por vezes,
a vida deixa
que sigamos
sem direção
para vastas profundezas
para que aprendamos
um pouco mais
sobre nós mesmos
e sobre o desapego
necessário para que possamos
viver.

No fim,
entendemos
que não precisamos
de nada:
apenas dos Deuses,
apenas de Deus.




Karla Bardanza


Irmãs e Irmãos, a Roda gira mais uma vez. Feliz Mabon!
Feliz Ostara para os irmãos do hemisfério norte. Que os Deuses te guardem
na palma de suas mãos.





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NOVAMENTE PASSARINHO



 Quadro de Rebecca Wetzel Wagstaff





Uma fase de singularidades
afasta-me de maiores horizontes.
O corpo desobserva
as mãos,
o coração afasta-se
das palavras,
a vida (vida?) estranha
as palavras.

Sinto sono
e o cansaço dos infelizes
arrasta-me para o poente
das metáforas.
Talvez seja apenas um surto,
um curto circuito,
qualquer coisa sem explicação
(como explicar o que parece não ter nome)

Sou um sujeito inexistente:
chove dor em mim.
Ou talvez indeterminado:
precisa-se de outra pessoa neste corpo.

E enquanto sou o meu próprio objeto,
perco a sintaxe, os predicados,
os dias folgados,
as coisas que deixam os Deuses
perto de mim.



Karla Bardanza


Caros leitores/as,


Não sei se a poesia me abandonou. Sinto apenas que estou orfã de mim mesma e neste exato momento, sou minha própria vítima. Não sei se poderia chamar isto de crise existencial ou falta de inspiração. Parece apenas que o coração parou de bater e que a vida saiu de mim para passear ai fora. Li uma frase de Charles Bukowski que me entende:
                         
"Há qualquer coisa dentro de mim que me magoa"

Um dia isso passa e serei passarinho outra vez como Mário Quintana. Obrigada.


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FILHA DO INFINITO

Quadro de Fattah Hallah



O que há em mim
em noites de luas cheias
é paraíso e encontro.

Um gato preto
me acompanha
nestas horas de magia
e se eu não sou eu,
sou o que resta da poesia.

Arranhamos
as costas das estrelas,
deitamos nus no céu,
querendo quase nada
que esteja entre o bem
ou mal.

Algo vai
muito além
do entendimento,
do tempo fora do tempo
e eu cada vez
me descubro assim:
uma mulher cheia de palavras
e ternos feitiços.

Ergo as mãos
para a eternidade
cada vez mais
sou filha do infinito.
Quando nada mais há,
ainda assim
tudo sou
porque tudo sinto.



Karla Bardanza

Amo gatos!



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SORTE

Quadro de Caleb O'Connor




Você aprendeu
poucas coisas comigo:
a diferença entre o i longo
e o curto,
a fonética silenciosa
do sentimento.
Ich Liebe dich 
entre os dentes.

Tudo que foi
ensinado perdeu-se
no erro e no exercício lento
do desapego
e mansidão.

Nada 
mais houve
depois da
última frase que eu te disse.
As palavras esgotaram-se
em minha boca
e o meu ofício
como tentativa,
calou-se.

Daqui
pra frente,
desejo-te apenas
uma única coisa:
sorte.




Karla Bardanza








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POEMA PARA MIM

Quadro de Gianni Bellini



Meu pensamento desliza
e vai sem mim,
encontrar explicações
para as coisas que estão
além do meu óbvio.

Do outro lado
do meu ver,
há poucas imagens:
apenas aquelas
que arrepiam a escuridão
e
todas elas
não cabem
nesse agora.

Preciso do que
pode existir
nos meus olhos
como
delicadeza
e
ousadia.
Preciso do
que alucina
a palavra
e a poesia.

Talvez apenas assim
eu consiga
estar definitivamente
além
da sensibilidade
das metáforas.



Karla Bardanza








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FLORES NAS MÃOS

Quadro de Joseph Q. Daily




Atravessei o dia,
engolindo dúvidas,
aumentando 
o meu desconhecimento
sobre tudo
que deixa a vida
mais intraquila
e cheia de caracóis
na parede.

Deslizei
dentro de mim,
ruminando coisas
que fazem as minhas mãos
mais geladas.

Se eu soubesse
em que lado nasce
o teu sol
e onde se põe
tudo que deixa
a minha vida
sombreada de frases
pela metade,
eu poderia
ter asas nas solas
dos meus sapatos
e flores nas mãos.

Olho para
as noites
que foram história,
refazendo mapas,
buscando trajetórias
mas me perco
no itinerário,
dentro do cenário
que não sorri.

E enquanto
perduram as manchas
nos vidros das janelas,
tudo fica muito mais difícil
de ver
e sentir.



Karla Bardanza




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COM INTIMIDADES COM A ESPERANÇA

Quadro de Diego Dayer





Recebo-te com ternura,
andando na parede,
despreferindo o amanhã
porque o agora
me recita
e
expande,
alargando meus seios,
sentidos
e vontades.

Tudo em mim
é cheio  de nascentes:
meus olhos te divinam,
respiro tua boca,
tuas palavras vestidas
de silêncios e reticências.
Estou repleta de intimidades
com a esperança e
algo em mim
pertence as cores
e aos loucos.

Arreganho
os braços
para que esse momento
caíba inteiro em
mim
e
fique
como luz empoçada
em minhas profundezas 
e contradições.


Karla Bardanza



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ILUMINADA

Quadro de Angel Peychinov





Quando completo
a eternidade,
minhas mãos estão
alucinadas
e de nada careço
porque cresço
em coisas sem nome.

O silêncio aumenta
e tudo que é sombreado,
diminui ainda mais.
Uma paz me atravessa
e minhas ribeiras
desaguam paisagens
e divindades.

Minha idade
desexplica
o que sou
enquanto
soletro
o que espero.

E
como
quem já 
sabe o final,
deixo que a vida
se aproprie
de mim.



Karla Bardanza





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FERA DOMESTICADA

Quadro de Phillipe Augé





Minha fera,
guardo do lado
de fora
para atacar as horas indelicadas,
os dias abafados,
essas coisas
que me causam
dormência
na alma.

Ela fica ali
comigo,
sempre em eterna
prontidão,
bem quietinha,
bem distante do meu céu,
quase em outra
dimensão.

Quase nunca,
ela é feroz.
Só fica assim
quando as linhas
nas palmas de minhas mãos
 estão cheias
de nós.



Karla Bardanza




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A QUASE INSUPORTÁVEL LEVEZA DO MEU SER

Quadro de Natalia Fabia






Tem dias
que estou pesada
e a esperança
não cabe no meu corpo.

O lado esquerdo
está morto
e não consigo
carregar
nada além
do que
um punhado
de nuvens
e trovões.

A tempestade
é sempre
maior do que
o meu copo d'água
pode suportar.

Quando
tudo transborda,
bebo eu mesma
o meu excesso
gota a gota,
e mato
essa sede
inexplicável
de amores impossíveis,
manhãs imprevisíveis
e tudo mais
que torna o meu ser
insuportavelmente
leve.



Karla Bardanza




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PEDIDO À BEIRA DO ABISMO

Quadro de Alejandro Barrón






Salve-me
do calor,
do salário curto,
do cansaço
e do desânimo.

Salve-me
dos ônibus lotados,
da falta de perspectiva,
das coisas que 
me diminuem
na sala sem ventilador
onde quarenta ou
mais morrem
de sede.

Salve-me
dos dias sem cor,
do desencanto,
do desnobre ofício
de não acreditar.

Salve-me
das coisas que
estou sempre adiando
por medo
ou falta de opção.

Salve-me
da dura tarefa
de ser eu mesma
todos os dias,
dos pratos amontoados
na pia,
das paredes mofadas,
de tudo
que atravessa
a garganta
e o mundo.

Salve-me
do nada
e da letargia,
das manhãs
sem respostas,
das apostas
vazias.

Salve-me
da vida
que mata.
da emoção
tosca
e barata,
da mordaça
na boca
cheia de dúvidas,
dos cadeados
que fecham
as portas
as mentes.

Já começo
a me afogar
dentro de mim
e nada sentido
faz algum
sentido.




Karla Bardanza









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